Investigadora portuguesa vai usar o James Webb para sondar o caldo químico onde nascem os planetas

Imagem obtida no infravermelho, com o telescópio espacial James Webb, de um detalhe da Nebulosa de Orionte.

Imagem obtida no infravermelho, com o telescópio espacial James Webb, de um detalhe da Nebulosa de Orionte.
Créditos: ESA/Webb, NASA, CSA, M. Zamani (ESA/Webb), the PDRs4All ERS Team

Sílvia Vicente, colaboradora do IA, lidera um plano de observação da famosa Nebulosa de Orionte e que foi aprovado para utilizar o maior telescópio no espaço, o James Webb.

“Vamos poder finalmente aceder à química neste tipo de ambientes. Vamos poder avaliar qual é o efeito do ambiente externo nos processos de formação planetária e nas propriedades dos discos.”
Sílvia Vicente

A sua equipa quer conhecer os compostos e processos químicos, mas também físicos que ocorrem nos discos de gás e poeira em torno das estrelas em formação. Estes discos, onde se poderão formar planetas, sofrem os efeitos da luz ultravioleta intensa e vento estelar (partículas carregadas) de estrelas de grande massa e muito brilhantes que se encontram na sua proximidade.

O Sol ter-se-á formado num ambiente semelhante à Nebulosa de Orionte, na vizinhança e sob a influência da radiação de estrelas massivas e muito brilhantes. Conhecer os discos onde se irão formar planetas ajudará os astrónomos a compreender as origens do nosso próprio sistema solar.

Em entrevista, a investigadora explica o que é que o telescópio irá observar, de que informação a sua equipa está à procura, e que perguntas científicas esperam conseguir esclarecer.

Sílvia Vicente: Observar a Nebulosa de Orionte com o telescópio espacial James Webb

 

Um disco de gás e poeira em torno de uma estrela jovem, semelhante ao que será alvo deste plano de observações com o telescópio espacial James Webb.
Um disco de gás e poeira (disco protoplanetário) em torno de uma estrela jovem, semelhante ao que será alvo deste plano de observações com o telescópio espacial James Webb.

Nesta imagem obtida com o James Webb é possível observar os efeitos sobre o disco produzidos pela luz ultravioleta e pelo vento de partículas provenientes de estrelas próximas brilhantes e massivas. O disco está a ser dissipado, num processo designado por fotoevaporação, e forma-se um casulo de gás e poeira em torno da estrela. O nosso Sol e o ambiente onde se formaram os planetas do Sistema Solar terão passado por um processo semelhante.

Créditos: NASA, ESA, CSA, Data reduction and analysis : PDRs4All ERS Team; graphical processing S. Fuenmayor & O. Berné.

O conjunto de estrelas muito brilhantes no centro desta imagem, chamadas estrelas do Trapézio, é responsável por iluminar o gás e a poeira da Nebulosa de Orionte
O conjunto de estrelas muito brilhantes no centro desta imagem (clique para expandir), chamadas estrelas do Trapézio, é responsável por iluminar o gás e a poeira da Nebulosa de Orionte, ao ponto de esta ser facilmente observável à vista desarmada. A luz ultravioleta destas estrelas parece ser determinante na síntese de certos compostos químicos.

No trabalho de Sílvia Vicente e dos seus colegas parecem acumular-se evidências de que existe uma relação entre a intensa radiação de estrelas massivas (com 20 ou 30 vezes a massa do Sol) e a formação de planetas, e até dos constituintes químicos da vida, em volta de outras estrelas nas proximidades.
Créditos: ESO/M.McCaughrean et al. (AIP)

Sílvia Vicente é membro também de um outro projeto de observação com o telescópio James Webb e que neste mês de junho anunciou uma descoberta inédita, também num disco protoplanetário na Nebulosa de Orionte. Descobriram uma molécula com base de carbono e que é crucial para a formação de moléculas mais complexas.

Esta revelação é muito importante pois a vida como a conhecemos baseia-se em moléculas complexas à base de carbono, ditas orgânicas. Também aqui a radiação ultravioleta emitida por estrelas próximas parece ter um papel importante na formação destes compostos.

Nebulosa de Orionte, um berçário de estrelas.
Nebulosa de Orionte, um berçário de estrelas e o alvo mais próximo da Terra para observar em detalhe a química dos ambientes onde se podem formar planetas.
Créditos: ESO and Digitized Sky Survey 2. Acknowledgment: Davide De Martin