Como encontrar um buraco negro

Conceção artística do ambiente em torno de um buraco negro.

Conceção artística do ambiente em torno de um buraco negro. Está representado o material envolvente atraído pelo poço gravitacional do buraco negro e formando um disco de acreção aquecido a altas temperaturas, e também um dos jactos perpendiculares ao disco.
Créditos: NASA/Dana Berry, SkyWorks Digital

Num safári fotográfico, o equipamento é essencial. Mas se o retrato é o de um buraco negro, primeiro temos de saber de que é que andamos à procura, e onde se esconde. São várias as estratégias. Eis algumas.

Artigo de Francisco Lobo e Sérgio Pereira1 em parceria com a National Geographic Portugal

 

Ainda que sejam difíceis de achar, os buracos negros são fáceis de imaginar. De facto, foram imaginados muito antes de serem descobertos. Teremos um buraco negro imaginário se colocarmos todo o material de que é feito o Sol concentrado no volume de uma esfera com apenas seis quilómetros de diâmetro (por comparação com os seus atuais 1,4 milhões de quilómetros). Mesmo assim, a Terra continuaria tranquilamente na sua órbita como se nada fosse, exceto o facto de termos entrado numa eterna noite gelada.

A massa do Sol não é suficiente para produzir um buraco negro – não conseguiria vencer as repulsões ao nível sub-atómico entre as partículas de matéria. Apenas as estrelas com mais de três vezes a massa do Sol o conseguem, no final da sua vida, assim que se extingue a energia nuclear interna. Produz-se então um corpo extremamente denso, tão denso que, para lhe escapar, seria necessário viajar a uma velocidade superior à da luz (no vácuo, são 300 000 quilómetros por segundo) – o que a Física já demonstrou ser impossível. Teremos então um objeto que não emite nem devolve qualquer luz, ou seja, negro em absoluto.

O berço de uma ideia exótica

O conceito de buraco negro (mas este nome só foi atribuído já na década de 1960, por John Wheeler) surgiu como consequência da teoria da gravitação de Albert Einstein, ou Teoria da Relatividade Geral, publicada em 1915. Uma das equações desta teoria foi resolvida pouco depois pelo alemão Karl Schwarzschild e descreve um objeto estranho, cuja densidade impede a luz de lhe escapar. Schwarzschild calculou a dimensão da fronteira esférica em redor desse objeto e para além da qual nada podemos saber daquilo que acontece nele. A essa fronteira chamamos “horizonte de eventos”.

Em 1939, os norte-americanos Robert Oppenheimer e Hartland Snyder redescobriram este objeto de Schwarzschild. Aconteceu quando aplicaram as equações de Einstein ao colapso da matéria que ocorre numa estrela massiva no seu final de vida, após se lhe esgotar o combustível que a ilumina. A gravidade, vencendo as remanescentes pressões da matéria, irá contraí-la até densidades extremas. Estava assim prevista a possibilidade de o objeto descrito por Schwarzschild de facto existir no Universo, como o resto mortal de estrelas com mais de cerca de três vezes a massa do Sol. A natureza possuia afinal um mecanismo que parecia dar origem a buracos negros.

Remanescente de uma estrela que explodiu no final do seu ciclo de vida, numa galáxia anã satélite da Via Láctea, a Grande Nuvem de Magalhães.
Remanescente de uma estrela que explodiu no final do seu ciclo de vida, numa galáxia anã satélite da Via Láctea, a Grande Nuvem de Magalhães. Estrelas mais massivas do que o Sol terminam a sua vida na forma de uma explosão – designada supernova –, que pode brilhar tanto como a luz reunida de todas as estrelas de uma galáxia. Para além do material expelido para o espaço envolvente, como se vê nesta imagem, resta um “cadáver” estelar, um corpo muito compacto que, conforme a massa original da estrela, tanto poderá ser uma estrela de neutrões, como um buraco negro.

Créditos: NASA, ESA, HEIC e The Hubble Heritage Team; STScI, AURA

Porém, a interpretação física daquilo em que realmente consiste esta “estrela colapsada” (nome que lhe era atribuído naquela época) só foi feita em detalhe ao longo das décadas de 1950 e 1960, com nomes como Robert Dicke, John Wheeler, Stephen Hawking ou Roger Penrose. Segundo os trabalhos destes físicos teóricos, toda a matéria da estrela seria destruída naquilo a que se chamou uma singularidade, o ponto central do buraco negro.

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  1. Francisco Lobo é doutorado em Física pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (Ciências ULisboa) e continuou a sua investigação em Inglaterra. Hoje em dia, de regresso a Ciências ULisboa, continua fascinado pelos estudos dos mecanismos internos da Natureza e do Cosmos, e trabalha com as equações que Einstein nos legou, há cerca de um século. Para além da investigação científica, em que atualmente é o coordenador do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA), Francisco Lobo está envolvido em atividades de formação e de divulgação.
    Sérgio Pereira é mestre em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova de Lisboa, com especialização em jornalismo de revista na Universidade de Nottingham Trent, no Reino Unido. Com formação de base em Design de Comunicação, é comunicador de ciência no Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA), onde produz conteúdos, eventos e projetos que estabelecem pontes entre a sociedade, a cultura e a astronomia.