Descoberto o elemento mais pesado na atmosfera de um exoplaneta

Representação artística de um exoplaneta júpiter ultra-quente. (Crédito: ESO/M. Kornmesser)

A parte confusa e contraintuitiva é: Porque é que estes elementos pesados existem na alta atmosfera destes planetas?”, questiona o investigador do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA1) Tomás Azevedo Silva, o primeiro autor do artigo2 publicado hoje na revista Astronomy & Astrophysics.

Interpretação artística da atmosfera do exoplaneta WASP-76b.
Representação artística da atmosfera do exoplaneta WASP-76b, onde se julga chover ferro. (Crédito: ESO/M. Kornmesser)

Os exoplanetas WASP-76 b e WASP-121 b não são exoplanetas “normais”. Ambos estão classificados como júpiteres ultra-quentes, pois são gigantes gasosos semelhantes ao nosso planeta Júpiter, mas que orbitam tão próximos das suas estrelas-mãe, que têm temperaturas a rondar os 2000 °C. Isto confere aos dois planetas características bastante exóticas – no WASP-76 b, por exemplo, os investigadores desconfiam que chova Ferro.

Isto foi uma ‘descoberta acidental’”, revela Azevedo Silva, aluno de doutoramento no Dep. de Física e Astronomia da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (DFAFCUP). “Não estávamos à procura, nem sequer à espera de encontrar bário e tivemos que confirmar que esta deteção vinha efetivamente do planeta, uma vez que nunca tinha sido observado antes em nenhum exoplaneta”.

A equipa3 ficou surpreendida por descobrir bário, que é 2,5 vezes mais pesado do que o ferro, na alta atmosfera destes exoplanetas. “Dada a elevada gravidade dos planetas, esperaríamos que elementos pesados como o bário caíssem rapidamente nas camadas mais inferiores da atmosfera”, explica Olivier Demangeon (IA & DFA-FCUP), co-autor do artigo.

Esta deteção de bário nestes dois júpiteres ultra-quentes sugere que esta categoria de exoplanetas pode ser ainda mais estranha do que se pensava. Nos nossos céus vemos bário ocasionalmente, na forma de fogo de artifício verde. A questão a que a equipa irá agora tentar responder é qual o processo natural que faz com que um elemento tão pesado possa existir nas altas altitudes destas atmosferas. “De momento, não temos a certeza que mecanismos são esses”, acrescenta Demangeon.

A análise da composição da atmosfera destes dois exoplanetas só foi possível graças à extrema precisão do espectrógrafo ESPRESSO4, instalado no telescópio VLT do Observatório Europeu do Sul (ESO), no Cerro Paranal (Chile).

A participação do IA no ESPRESSO faz parte de uma estratégia mais abrangente para promover a investigação em exoplanetas em Portugal, através da construção, desenvolvimento e definição científica de vários instrumentos e missões espaciais, como a missão Cheops (ESA), já em órbita. Esta estratégia irá continuar durante os próximos anos, com o lançamento do telescópio espacial PLATO (ESA), a missão Ariel (ESA) e a instalação do espectrógrafo ANDES5, no maior telescópio da próxima geração, o ELT (ESO).


Notas

  1. O Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA) é a instituição de referência na área em Portugal, integrando investigadores da Universidade de Lisboa, Universidade de Coimbra e Universidade do Porto, e englobando a maioria da produção científica nacional na área. Foi avaliado como “Excelente” na última avaliação de unidades de investigação e desenvolvimento organizada pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT). A atividade do IA é financiada por fundos nacionais e internacionais, incluindo pela FCT/MCES (UIDB/04434/2020 e UIDP/04434/2020).
  2. O artigo “Detection of Barium in the atmospheres of ultra-hot gas giants WASP-76b & WASP-121b, And new detections of Co and Sr+ on WASP-121b”, foi publicado hoje na revista Astronomy & Astrophysics (DOI: 10.1051/0004-6361/202244489).
  3. A equipa é composta por:  T. Azevedo Silva, O. D. S. Demangeon, N. C. Santos, R. Allart, F. Borsa, E. Cristo, E. Esparza-Borges, J. V. Seidel, E. Palle, S. G. Sousa, H. M. Tabernero, M. R. Zapatero Osorio, S. Cristiani, F. Pepe, R. Rebolo, 7, V. Adibekyan, Y. Alibert, S. C. C. Barros, V. Bourrier, P. Di Marcantonio, V. D’Odorico, D. Ehrenreich, P. Figueira, J. I. González Hernández, C. J. A. P. Martins, A. Mehner, G. Micela, P. Molaro, D. Mounzer, N. J. Nunes, A. Sozzetti, A. Suárez Mascareño e S. Udry.
  4. O ESPRESSO (Echelle SPectrogaph for Rocky Exoplanet and Stable Spectroscopic Observations) é um espectrógrafo de alta resolução, instalado no observatório VLT (ESO). Foi construído com o objetivo de procurar e detetar planetas parecidos com a Terra, capazes de suportar vida. Para tal, consegue detetar variações de velocidade de cerca de 0,3 km/h. Tem ainda por objetivo testar a estabilidade das constantes fundamentais do Universo.
  5. O ANDES (ArmazoNes high Dispersion Echelle Spectrograph, ou espectrógrafo de Echelle de alta dispersão do Armazones) é um espectrógrafo, a ser instalado no ELT (em Cerro Armazones, deserto do Atacama, Chile). Irá observar, com grande precisão, objetos individuais no visível e no infravermelho, o que Irá permitir procurar indícios de vida através da análise da atmosfera de exoplanetas, estudar a evolução de galáxias e identificar a primeira geração de estrelas que se formaram no Universo primitivo, ou determinar se as constantes do Universo variam ao longo do tempo.

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