06 de abril de 2023 – Recorrendo a dados dos satélites Kepler (NASA), Gaia (ESA) e SOHO (NASA/ESA), uma equipa1 liderada pela investigadora do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA2) Ângela Santos, parece ter posto um fim à ideia de que o Sol não seria uma estrela normal, do “tipo solar”. Os resultados foram publicados hoje na revista Astronomy & Astrophysics3.
Embora pareça estranho tentar saber se o Sol é uma estrela do tipo solar, Ângela Santos, investigadora da equipa “Rumo a um estudo abrangente de estrelas” do IA na Universidade do Porto, explica o problema: “Na comunidade existe um debate sobre se o Sol é ou não uma estrela do ‘tipo solar’. Em particular, sobre a sua atividade magnética, vários estudos sugeriam que estrelas semelhantes ao Sol seriam significativamente mais ativas.” Mas, na opinião desta investigadora: “o problema parece não estar no Sol, mas nas estrelas que são classificadas como do ‘tipo solar’, pois existem várias limitações e viés nos dados observacionais e nas propriedades das estrelas que são inferidas”, acrescenta Santos.
Para este trabalho, foram escolhidas estrelas com propriedades muito semelhantes às do Sol. A equipa usou um novo catálogo de propriedades de estrelas, provenientes de observações do satélite Kepler, além de alguns dados do satélite Gaia e ainda do catálogo de períodos de rotação e índices de atividade magnética da própria equipa. Os dados destas estrelas foram comparados com a atividade dos últimos dois ciclos de atividade do Sol, obtidos pelo instrumento VIRGO/SPM, a bordo do telescópio espacial solar SOHO.
Uma das estrelas estudadas, escolhida do catálogo do Kepler, foi carinhosamente apelidada de “Doris” pelos astrónomos. Num trabalho anterior, a equipa já tinha observado que a amplitude do ciclo de “Doris” era mais de duas vezes maior do que os ciclos solares mais recentes, isto apesar de “Doris” ter propriedades muito semelhantes às do Sol. Santos explica que “a diferença era a metalicidade. A nossa interpretação é que o efeito da metalicidade, que torna a zona de convecção mais profunda, levando a um dínamo mais eficaz, o que implica um ciclo de atividade mais forte”.
Neste recente trabalho, quando a equipa selecionou estrelas semelhantes a “Doris”, sem considerar a metalicidade na seleção, encontrou um excesso de estrelas com elevada metalicidade. “Na nossa seleção, o único parâmetro que poderia levar a este excesso é o período de rotação. Em particular, Doris tem um período mais longo do que o Sol. E encontramos de facto evidências para uma correlação entre o período de rotação e a metalicidade”, diz Santos.
Os resultados dos dois trabalhos são consistentes, pois a atividade magnética mais forte significa que o processo de travagem magnética leva a um período de rotação mais lento, o que explica porque é que “Doris” tem uma rotação mais lenta do que o Sol, apesar de ser muito semelhante e ligeiramente mais nova do que o Sol.
Angela Santos conclui: “O que descobrimos é que, apesar de haver estrelas mais ativas do que o Sol, o Sol é uma estrela do tipo solar completamente normal.”
Notas
- A equipa é composta por: A.R.G. Santos, S. Mathur, R. A. García, A.-M. Broomhall, R. Egeland, A. Jiménez, D. Godoy-Rivera, S. N. Breton, Z. R. Claytor, T. S. Metcalfe, M. S. Cunha e L. Amard.
- O Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA) é a instituição de referência na área em Portugal, integrando investigadores da Universidade de Lisboa, Universidade de Coimbra e Universidade do Porto, e englobando a maioria da produção científica nacional na área. Foi avaliado como “Excelente” na última avaliação de unidades de investigação e desenvolvimento organizada pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT). A atividade do IA é financiada por fundos nacionais e internacionais, incluindo pela FCT/MCES (UIDB/04434/2020 e UIDP/04434/2020).
- O artigo “Temporal variation of the photometric magnetic activity for the Sun and Kepler solar-like stars”, foi publicado hoje na revista Astronomy & Astrophysics Vol.672, A56 (DOI: 10.1051/0004-6361/202245430).
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