Esta missão, da Agência Espacial Europeia (ESA) e que conta com a forte participação do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA), alcançou uma etapa decisiva.
Será que existem planetas semelhantes à Terra? E estes orbitam estrelas semelhantes ao Sol? Como é que se formam e evoluem os sistemas planetários? Para responder a estas questões, em 2026 a Agência Espacial Europeia (ESA) vai lançar para o espaço a missão PLATO, que conta com o contributo científico do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA1).
A PLATO (PLAnetary Transits and Oscillations of stars, ou trânsitos planetário e oscilações de estrelas), que foi incluída no programa científico da ESA há 8 anos, alcançou agora uma etapa decisiva: Nas instalações da empresa aeroespacial e tecnológica OHB, na Alemanha, o banco ótico do telescópio, com as suas 26 câmaras, foi integrado no módulo de serviço da nave espacial. Este aloja todos os componentes necessários para o voo espacial, controlo e operações do telescópio, incluindo a propulsão, a antena para comunicar com a Terra e os sistemas de transmissão de dados científicos.

Destas 26 câmaras, duas são câmaras ‘rápidas’, que leem os seus dados a cada 2,5 segundos, para alinhar com precisão a PLATO e mantê-la na trajetória correta. As restantes 24 câmaras ‘normais’ registam curvas de luz, a partir das quais se podem identificar sinais de potenciais planetas. Cada uma tem 4 CCD’s que geram imagens de 81,4 megapixels, o que no total irá dar origem a imagens de 2 milhões de pixels.
Este design inovador da PLATO permitirá estudar cerca de 250.000 estrelas a partir do ponto de Lagrange2 L2, situado a 1,5 milhões de quilómetros da Terra. Usando o método dos trânsitos3, a mesma técnica utilizada em missões anteriores de deteção de exoplanetas, como a franco-europeia CoRoT (ESA/CNRS) ou a Kepler (NASA), a PLATO pretende descobrir milhares de exoplanetas rochosos, gelados e gasosos. Os planetas identificados serão posteriormente analisados com recurso a telescópios terrestres.
A PLATO irá ainda medir as oscilações naturais das estrelas, através da asterossismologia4. Estas oscilações são sondas únicas das camadas mais profundas das estrelas, tornando possível inferir a sua estrutura interna e as suas condições físicas, ao mesmo tempo que permitem uma precisão incomparável na estimativa das suas propriedades globais (por exemplo, massa e idade).
As câmaras agora instaladas no telescópio espacial PLATO possuem características especiais que permitem recolher dados relevantes para o estudo de exoplanetas. Além da rápida velocidade de leitura, estas estão equipadas com filtros que permitem a deteção de eventos de trânsito em comprimentos de onda curtos (azul) e longos (vermelho). As variações nos sinais observados entre esses comprimentos de onda podem revelar a presença de atmosfera nos exoplanetas estudados.
Numa próxima fase a PLATO será enviada para o ESTEC, o centro da ESA nos Países Baixos, onde receberá os painéis e escudos solares, e será testada numa câmara de simulação de ambiente espacial. Na etapa final seguirá para Kourou, na Guiana Francesa, com lançamento marcado para dezembro de 2026, a bordo de um foguetão Ariane 6 da ESA.
Segundo o líder da Equipa de Sistemas Planetários do IA e representante nacional no “board” da missão, Nuno Cardoso Santos: “este esforço segue uma aposta que já passou por uma contribuição chave em projetos como os espectrógrafos ESPRESSO e NIRPS, do Observatório Europeu do Sul (ESO), e a missão espacial CHEOPS (ESA).”
A partir de 2027, a missão começará a procurar planetas em outros sistemas estelares, com especial incidência para os planetas do tipo terrestre, que orbitam estrelas semelhantes ao Sol. Neste contexto, a participação do IA na PLATO encaixa na estratégia delineada para que a instituição possa manter-se na linha da frente da descoberta de outras Terras. ”Vamos continuar com a já garantida participação ao mais alto nível na construção do ANDES, um espectrógrafo da próxima geração atualmente a ser planeado para o ELT (ESO) e que vai permitir estudar as atmosferas de outras Terras a orbitar outros sóis”, acrescenta Santos, também Professor Catedrático no Dep. de Física e Astronomia da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (DFA–FCUP).
Mas a participação nacional nesta missão só foi possível graças ao forte apoio dado pela Agência Espacial Portuguesa (Portugal Space), através do gabinete PRODEX, da ESA. E o IA participa nesta missão em várias frentes: foi responsável pelo desenvolvimento de um equipamento óptico, utilizado para suporte à integração do telescópio com o sensor de cada uma das câmaras. Foram fornecidos dois destes sistemas ao Centro Espacial de Liége (CSL), o responsável pela integração das 26 câmaras.
O coordenador do IA Manuel Abreu (IA & Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa), responsável por esta componente, refere que: “este equipamento operou continuamente durante os dois anos em que decorreu o processo de integração de todas as câmaras do PLATO, funcionando como uma referência de alta precisão para assegurar a uniformidade na performance de todos estes sistemas”.
O IA é igualmente responsável pelo desenvolvimento de diferentes componentes do software da missão5, que vão desde o código que permite identificar a posição exata para onde as câmaras estão a apontar, até componentes de software essenciais para planear que estrelas vão ser observadas, ou analisar os dados que vão ser recolhidos.
A participação do IA nesta missão da ESA permitiu ainda o envolvimento da indústria nacional. A empresa Frezite High Performance (FHP) foi responsável pelo desenho e construção dos cobertores térmicos multicamada (MLI) que protegem as câmaras do PLATO, uma componente fundamental para o sucesso da missão. Já a Deimos Engenharia contribuiu para o desenvolvimento de algumas componentes de software críticas para o planeamento das observações.
Notas
- O Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA) é a instituição de referência na área em Portugal, integrando investigadores da Universidade de Lisboa, Universidade de Coimbra e Universidade do Porto, e englobando a maioria da produção científica nacional na área. Foi avaliado como “Excelente” na última avaliação de unidades de investigação e desenvolvimento organizada pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT). A atividade do IA é financiada por fundos nacionais e internacionais, incluindo pela FCT/MCES (UIDB/04434/2020 e UIDP/04434/2020).
- Os Pontos de Lagrange são locais no espaço onde as forças gravitacionais de dois corpos se equilibram. Há 5 pontos de Lagrange, dos quais dois são estáveis e três instáveis. Nos pontos de Lagrange entre a Terra e o Sol, um satélite pode manter uma posição estável com um gasto mínimo de energia.
O Ponto de Lagrange L2 está localizado a 1,5 milhões de quilómetros “atrás” do nosso planeta, ao longo da linha Sol-Terra. É particularmente valioso para a astronomia porque telescópios espaciais, como o PLATO e o James Webb, podem operar aí sem serem perturbados pela radiação terrestre, mantendo uma linha ininterrupta de comunicação com a Terra e uma visão permanente do espaço profundo. - O Método dos Trânsitos consiste na medição da diminuição da luz de uma estrela, provocada pela passagem de um exoplaneta à frente dessa estrela (algo semelhante a um micro-eclipse). Através de um trânsito é possível determinar apenas o raio do planeta. Este método é complicado de usar, porque exige que o(s) planeta(s) e a estrela estejam exatamente alinhados com a linha de visão do observador.
- A asterossismologia é o estudo do interior das estrelas através da sua atividade sísmica medida à superfície. Em sismologia, os diferentes modos de vibração de um tremor de Terra podem ser usados para estudar o interior da Terra, ao fornecerem dados acerca da composição e profundidade das diversas camadas. De forma semelhante, as oscilações observadas à superfície de uma estrela podem ser usadas para inferir dados sobre a sua estrutura interna, composição e idade, de forma semelhante a uma ecografia. Este e outros temas de astrofísica estelar são desenvolvidos numa App interativa, direcionada a não-especialistas, disponível aqui.
- A equipa do IA é responsável pelas seguintes componentes da missão: Optical Ground Support Equipment (Manuel Abreu), “Star centroids” and “Target Position” (Elena Duarte), “Astrophysical False Positive Vetting” e “False Positive Modelling and Candidate Ranking” (Susana Barros), Model Grid Acquisition (Tiago Campante) e Target Preparation Tools (Filipe Pereira). Há ainda investigadores a trabalhar no desenvolvimento de software ou na preparação científica da missão (Margarida Cunha, Sérgio Sousa, Vardan Adibekyan, João Gomes da Silva).
Contactos
Nuno Cardoso Santos; Manuel Abreu (Coordenador do IA); Tiago Campante; Susana Barros
Grupo de Comunicação de Ciência
Ricardo Cardoso Reis; Filipe Pires (coordenação)