Novo planeta detetado em órbita da estrela mais próxima do Sol

Imagem artística de Proxima d, o candidato a planeta recentemente detetado à volta da estrela anã vermelha, Proxima Centauri, a estrela mais próxima do Sol. (Crédito: ESO/L. Calçada)

O exoplaneta, denominado Proxima d, foi detetado por uma equipa liderada por um investigador do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço e é o mais “leve” descoberto com o método das velocidades radiais.


10 de fevereiro de 2022 –  Uma equipa1 internacional, liderada pelo investigador do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IAstro2) João Faria, usou o espectrógrafo ESPRESSO3, instalado no Very Large Telescope (VLT) do Observatório Europeu do Sul (ESO), para detetar um novo planeta à volta da estrela mais próxima do Sol – Proxima Centauri.

João Faria (IAstro e Dep. de Física e Astronomia da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto), o primeiro autor do artigo4 agora publicado na revista Astonomy & Astrophysics, comenta: “Esta descoberta mostra que a estrela mais próxima parece albergar vários planetas parecidos com a Terra, que poderão vir a ser estudados em detalhe ou, quem sabe até visitados no futuro.”

O espectrógrafo ESPRESSO, instalado no VLT do ESO. Esta é a sala onde os raios luminosos, provenientes do quatro Telescópios Principais do VLT, são combinados. (Créditos: ESO/P. Horálek)

Proxima d demora apenas 5 dias a completar uma órbita e está a uma distância da sua estrela de cerca de um décimo da distância entre Mercúrio e o Sol. Com apenas um quarto da massa da Terra, o efeito gravítico do planeta na estrela é tão pequeno que provoca um movimento em Proxima Centauri de apenas 40 centímetros por segundo (ou 1,44 quilómetros por hora). Este torna-se o exoplaneta menos massivo detetado até agora com o método das velocidades radiais5.

Já no verão passado um exoplaneta com metade da massa de Vénus em órbita da estrela L98-59, tinha sido descoberto por uma equipa liderada pelo investigador do IAstro Olivier Demangeon, demonstrando que o ESPRESSO é sensível a planetas de muito pequena massa. Mas a deteção de Proxima d só foi possível graças a um novo método de análise de dados, que tem vindo a ser desenvolvido pelo estudante de doutoramento do IAstro, André Silva. Este método permite extrair ainda mais informação dos espectros observados com o ESPRESSO, o que resulta numa maior precisão na medição da velocidade radial.

“Até a última década do século passado, conhecíamos apenas os planetas do nosso próprio sistema solar. É fascinante ver que a participação de Portugal no ESO permite aos cientistas, engenheiros e engenheiras de instituições portuguesas participar em projetos internacionais de impacto como o ESPRESSO que contribuem para a descoberta de outros mundos e para a compreensão das nossas origens cósmicas.”
Cláudio Melo (Portugal Space)

“Esta façanha é extremamente importante, porque mostra que o método das velocidades radiais tem potencial para revelar uma população de exoplanetas ‘leves’ como o nosso, que se pensa serem os mais abundantes na nossa galáxia e que, potencialmente, podem albergar vida como nós a conhecemos.” acrescenta Pedro Figueira (IAstro & ESO), cientista do instrumento ESPRESSO no ESO.

À volta desta estrela já eram conhecidos outros dois planetas: o primeiro, Proxima b, com uma massa semelhante à da Terra, orbita na zona de habitabilidade da estrela e o segundo, o candidato a planeta Proxima c, com uma longa órbita de 5 anos.

Este mapa mostra a constelação austral do Centauro. A localização da estrela mais próxima do Sistema Solar, Proxima Centauri, está marcada com um círculo vermelho. (Crédito: ESO/IAU e Sky & Telescope)

Proxima b foi detetado em 2016 com o espectrógrafo HARPS6, instalado no telescópio de 3,6 metros do ESO e confirmado em 2020, com o ESPRESSO. Os dados usados em 2020  mostravam já alguns indícios de um sinal consistente com um planeta, com um período de 5 dias, mas este era demasiado fraco para descartar atividade da própria estrela. Depois de uma nova campanha de observação em 2021, tornou-se claro que a melhor explicação seria a presença de um terceiro exoplaneta.

Para Alexandre Cabral (IAstro & Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa), o investigador responsável pela  equipa de Instrumentação e Sistemas para Astronomia do IAstro: “Este resultado demonstra não só a qualidade da investigação realizada no IAstro, mas também a importância da participação na construção do ESPRESSO, permitindo-nos ter acesso privilegiado aquele que é neste momento o espectrógrafo mais avançado no estudo de exoplanetas.”

A estratégia do IAstro nesta área, atualmente em plena implementação com o espectrógrafo ESPRESSO, irá continuar durante os próximos anos, com o lançamento do telescópio espacial PLATO (ESA) em 2026, da missão ARIEL (ESA) em 2029, e da instalação do espectrógrafo HIRES7 no maior telescópio da próxima geração, o ELT (ESO), previsto para entrar em funcionamento em 2030.


Notas

  1. A equipa é constituída por: J. P. Faria, A. Suárez Mascareño, P. Figueira, A. M. Silva, M. Damasso, O. Demangeon, F. Pepe, N. C. Santos, R. Rebolo, S. Cristiani, V. Adibekyan, Y. Alibert, R. Allart, S. C. C. Barros, A. Cabral, V. D’Odorico, P. Di Marcantonio, X. Dumusque, D. Ehrenreich, J. I. González Hernández, N. Hara, J. Lillo-Box, G. Lo Curto, C. Lovis, C. J. A. P. Martins, D. Mégevand, A. Mehner, G. Micela, P. Molaro, N. J. Nunes, E. Pallé, E. Poretti, S. G. Sousa, A. Sozzetti, H. Tabernero, S. Udry e M. R. Zapatero Osorio.
  2. O Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço é a instituição de referência na área em Portugal, integrando investigadores da Universidade de Lisboa, Universidade de Coimbra e Universidade do Porto, e englobando a maioria da produção científica nacional na área. Foi avaliado como “Excelente” na última avaliação de unidades de investigação e desenvolvimento organizada pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT). A atividade do IA é financiada por fundos nacionais e internacionais, incluindo pela FCT/MCES (UIDB/04434/2020 e UIDP/04434/2020).
  3. O ESPRESSO (Echelle SPectrogaph for Rocky Exoplanet and Stable Spectroscopic Observations) é um espectrógrafo de alta resolução, instalado no observatório VLT (ESO). Foi construído com o objetivo de procurar e detetar planetas parecidos com a Terra, capazes de suportar vida. Para tal, consegue detetar variações de velocidade de cerca de 0,3 km/h. Tem ainda por objetivo testar a estabilidade das constantes fundamentais do Universo.
  4. O artigo “A candidate short-period sub-Earth orbiting Proxima Centauri”, foi hoje publicado na revista Astronomy & Astrophysics, Vol. 658 (A115) (DOI: 10.1051/0004-6361/202142337).
  5. O Método das Velocidades Radiais deteta exoplanetas medindo pequenas variações na velocidade (radial) da estrela, devidas ao movimento que a órbita desses planetas imprime na estrela. A título de exemplo, a variação de velocidade que o movimento da Terra imprime no Sol é de apenas 10 cm/s (cerca de 0,36 km/h). Com este método é possível determinar o valor mínimo da massa do planeta. No entanto, em conjunto com o método dos trânsitos, é possível determinar a massa real.
  6. O HARPS (High Accuracy Radial velocity Planet Searcher, ou pesquisador de planetas de alta resolução por velocidades radiais) é um espectrógrafo de alta resolução, instalado no telescópio ESO de 3,6 metros do observatório de La Silla (Chile). Deteta variações de velocidade inferiores a 4 km/h (ou aproximadamente a velocidade de uma pessoa a caminhar).
  7. O HIRES (High Resolution Spectrograph, ou espectrógrafo de alta resolução) é um espectrógrafo, a ser instalado no ELT, que irá observar, com grande precisão, objetos individuais no visível e no infravermelho. Irá permitir procurar indícios de vida através da análise da atmosfera de exoplanetas, estudar a evolução de galáxias e identificar a primeira geração de estrelas que se formaram no Universo primitivo, ou determinar se as constantes do Universo variam ao longo do tempo.

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