Se a sua curiosidade trouxe até aqui é porque talvez queira assistir, ou tenha assistido ao espetáculo Ruído.
Ruído aborda questões que a investigação em astrofísica coloca à nossa forma antropocêntrica de conhecer o mundo, e questiona o sítio a partir do qual a astrofísica se desenvolve no seu desígnio de compreender melhor o destino das estrelas, os buracos negros, e a origem do Universo. A informação nesta página pretende oferecer alguma informação, a partir da qual a experiência de assistir a “Ruído” possa ser talvez mais rica. Que este seja o princípio de um Universo invisível por descobrir.
Andar mais rápido é chegar atrasado
O tempo não é absoluto nem uniforme, não avança ao mesmo ritmo em todo o lado. O tempo, para um corpo com massa que esteja em movimento, como por exemplo, um relógio, varia com a velocidade a que este se move. O tique-taque do relógio será mais lento do que o de um relógio parado.
Esta alteração é imperceptível nas velocidades do nosso dia-a-dia, mas se viajássemos num hipotético aparelho que se aproximasse da velocidade da luz, tudo em nós iria decorrer muito mais devagar.

Créditos: Henze, NASA.
Apesar de, por vezes, o tempo nos parecer “passar” mais rápido ou devagar, conforme os momentos agitados ou aborrecidos da nossa vida, pensávamos até há pouco tempo que o tempo era um fluxo imparável, constante, e sobretudo, igual para todas as pessoas. É o chamado tempo absoluto.
Num hipotético aparelho que se aproximasse da velocidade da luz, tudo decorreria muito mais devagar: o tique-taque do nosso relógio, as reações químicas do nosso metabolismo, o nosso pensamento e o nosso envelhecimento.
No início do século XX, o físico Albert Einstein (1879-1955) conseguiu explicar os resultados inesperados de experiências que mediram a velocidade da luz. Ele percebeu que, se a velocidade da luz no vácuo nunca se altera, então o tempo tem de ser, afinal, relativo.
Segundo a sua famosa Teoria da Relatividade, quanto mais rápido um corpo com massa se mover, mais o seu relógio se atrasa em relação a outro relógio que esteja parado. Se esse corpo formos nós, também mais lentas serão as reações químicas do nosso metabolismo, o nosso pensamento e o nosso envelhecimento.
A matéria “atrasa” o tempo
A matéria também tem o poder de travar o fluxo do tempo. Se nos afastarmos da Terra, o nosso tempo acelera em relação ao ritmo a que decorre à superfície.

Créditos: NASA/Aubrey Gemignani (eclipse solar); IA (infografia).
Einstein percebeu também que o tempo se altera conforme a quantidade de matéria que ocupa uma região do espaço. A proximidade de um corpo com muita massa, como a Terra ou o Sol, abranda o ritmo do tempo, por comparação com um ponto do espaço mais afastado.
Os corpos com massa curvam o espaço e prolongam a seta do tempo.
Estas alterações ao ritmo de passagem do tempo foram já comprovadas com relógios extremamente precisos, capazes de medir intervalos ínfimos de tempo, colocados em órbita da Terra.
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Pés na Terra, e o Sol sempre por perto
O tempo, por pouco intuitivo que pareça, é uma quarta dimensão, a juntar-se às três dimensões do espaço: largura, profundidade e altura. Estas quatro dimensões formam o espaço-tempo.
Se não houvesse matéria no Universo, o espaço-tempo seria plano. São os corpos com massa que deformam essa planície, criando covas, vales e poços em quatro dimensões. Por exemplo, a Terra produz no espaço-tempo uma depressão. É essa depressão que nos faz “escorregar” de novo para o chão sempre que damos um salto.

Créditos: SXS, the Simulating eXtreme Spacetimes (SXS) project (http://www.black-holes.org)
Einstein, ao descrever o tempo como a quarta dimensão do espaço-tempo, conseguiu explicar várias coisas. Uma delas foi a órbita de Mercúrio em volta do Sol, que não segue à risca as leis estabelecidas por Isaac Newton. Percebeu também que o Sol desvia a luz das estrelas que estão na mesma região do céu, fazendo-nos parecer que estão numa posição diferente da sua posição real. Este efeito de lente, chamado lente gravitacional, pode ser observado durante um eclipse solar.
Quando os corpos com massa aceleram ou abrandam o seu movimento, ou mudam de direção, produzem uma perturbação na curvatura do espaço-tempo, que estica e encolhe o espaço, e acelera e desacelera o tique-taque dos relógios, periodicamente.
Segundo Einstein, os corpos com massa curvam o espaço e prolongam a seta do tempo. Tanto a Terra como o Sol produzem no espaço-tempo uma depressão, uma cova, como a depressão no pano esticado de um toldo criada pelo peso de uma bola.
A gravidade resulta dessa deformação, ou curvatura, do espaço-tempo. A Terra continua, ano após ano, a orbitar o Sol porque seria preciso alguma força que a fizesse vencer o declive do poço gravitacional produzido pelo Sol para poder afastar-se dele.
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Tremores no espaço e no tempo
A curvatura do espaço-tempo é constantemente moldada pelos corpos que nele se movem. Quando os corpos com massa aceleram ou abrandam o seu movimento, ou mudam de direção, produzem uma perturbação no “relevo” do espaço-tempo que se propaga como uma onda. É uma onda gravitacional.
Uma onda gravitacional estica e encolhe o espaço, e acelera e desacelera o tique-taque dos relógios, periodicamente.

Créditos: ESA
A Terra em órbita do Sol, e o Sol no seu movimento em torno do centro da Galáxia, estão constantemente a mudar de direção e a perturbar a curvatura do espaço-tempo. Por isso estão constantemente a produzir ondas gravitacionais.
Podemos visualizar as ondas gravitacionais perturbando a superfície quadridimensional do espaço-tempo como as ondas concêntricas produzidas na superfície de um lago por um pato que a perturba ao nadar através dela.
Tal como estas ondas na superfície do lago, as ondas gravitacionais são oscilações entre valores máximos e mínimos, entres cristas e vales. Elas esticam e encolhem o espaço-tempo periodicamente em direções alternadas. Ao passarem por nós, elas esticam e encolhem o nosso corpo, e alteram a duração dos processos fisiológicos que ocorrem no nosso corpo.
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Nós produzimos ondas gravitacionais
O nosso caminhar, ou agitar da mão, produzem ondas gravitacionais, mas estas são de escala inimaginavelmente pequena.
Pensou-se durante muito tempo que nunca seria possível detetar ondas gravitacionais, pois mesmo objetos muito massivos produziriam oscilações extremamente pequenas, que estariam sempre para lá da sensibilidade de qualquer instrumento de medição concebível.
Em 1916, Albert Einstein previu a existência de ondas gravitacionais, produzidas por qualquer corpo com massa que se movesse com velocidade variável, em intensidade ou direção. Previu também que nunca seríamos capazes de as detetar.
Os observatórios de ondas gravitacionais abriram uma nova janela de observação – permitem sondar o Universo invisível, que não emite qualquer tipo de luz.
Mas, em 1974, as ondas gravitacionais foram confirmadas indiretamente. Verificou-se que o período orbital de um par de objetos que resultam do final de vida de certas estrelas, chamados pulsares, diminui exatamente como se eles estivessem a produzir ondas gravitacionais segundo as leis de Einstein.
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Observatórios gravitacionais
As ondas gravitacionais produzidas a milhares de milhões de anos-luz, quando chegam ao Sistema Solar depois de se propagarem pelo Universo, provocam oscilações no espaço ínfimas, que podem ser milhares de vezes mais pequenas do que a escala de uma das partículas que compõem o núcleo dos átomos. O desenvolvimento de tecnologia capaz de superar este desafio de medição é um dos prodígios do engenho humano.
A primeira deteção direta de ondas gravitacionais ocorreu em setembro de 2015. Os observatórios de ondas gravitacionais conseguem sondar o Universo invisível, que não emite qualquer tipo de luz, mas que emite ondas gravitacionais. Permitem assim estudar objetos que estão na sua origem mas não podemos ver, como os buracos negros.

Créditos: AEI/MildeMarketing/Exozet
São vários os fenómenos astronómicos que produzem ondas gravitacionais com intensidade significativa: corpos compactos e massivos, como os buracos negros, em movimento acelerado ou em colisão, mas também estrelas que explodem, e processos físicos que ocorreram nos instantes iniciais de vida do universo.
A tecnologia para as detetar está materializada nos observatórios de ondas gravitacionais. O primeiro deles, que inaugurou a Astronomia das ondas gravitacionais com a deteção de 2015, foi o LIGO (Laser Interferometer Gravitational-wave Observatory), nos Estados Unidos.
O LIGO e outros observatórios sondam o Universo invisível que habitualmente escapa aos telescópios tradicionais, ou revelam informação complementar àquela que se obtém através da luz. As ondas gravitacionais abrem uma nova janela de observação de acontecimentos no Universo a que não é possível aceder através da luz.
Além do LIGO, existem atualmente observatórios em Itália, na Alemanha e no Japão. Um observatório será construído no espaço pela Agência Espacial Europeia (ESA), em colaboração com a agência americana NASA. A constelação LISA (Laser Interferometer Space Antenna) funcionará como um gigantesco detector de ondas gravitacionais.
A observação de um mesmo fenómeno por vários detetores espalhados pela Terra permite delimitar a região do céu onde se encontra o fenómeno que originou as ondas gravitacionais. Então, os telescópios tradicionais, no solo e em órbita, podem voltar-se para aí e tentar captar informação complementar na forma de luz.
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- [Vídeo] O que são ondas gravitacionais e a descoberta de LIGO
- [Website] O observatório LIGO (em inglês)
Ondas gravitacionais e o Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço
O Grupo de Instrumentação do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA) participou no processo de desenvolvimento da tecnologia necessária para o futuro observatório de ondas gravitacionais a ser colocado no espaço.
O LISA permitirá detectar ondas gravitacionais numa gama de frequências que não podem ser detetadas a partir de observatórios na Terra e que são produzidas por outros fenómenos astronómicos.
Não nos chega, nem pode chegar, nenhuma luz directamente do Universo primordial, mas podemos ouvir o “ruído” desse passado distante e, através dele, perceber como era o Universo nessa altura. Uma das promessas do LISA vai ser ajudar a desvendar um dos maiores mistérios da física: o que aconteceu no início do Universo.
O tipo de ondas gravitacionais que irão ser detetadas pelo LISA pode também revelar mais sobre a natureza da gravidade e como ela determina a história e evolução do Universo. Esta “arqueologia” astronómica é um dos domínios a que se dedicam vários investigadores do IA: tentar perceber como tudo começou e como tudo vai acabar.
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Com o apoio do projeto “Gwstrings: À procura de cordas cósmicas e outros defeitos topológicos com ondas gravitacionais”