Descoberto “gelo seco” nos fósseis da infância do Sistema Solar
Conceção artística de um objeto gelado na região do Sistema Solar designada Cintura de Kuiper, para lá da órbita de Neptuno, e representativo dos objetos transneptunianos.
Créditos: NASA, ESA, and G. Bacon (STScI)
Observações com o telescópio James Webb e a participação do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA) revelaram dióxido de carbono nos gelos para lá de Neptuno, o que pode informar estudos como os da origem da vida na Terra.
Os cientistas pensam que os objetos gelados para lá da órbita de Neptuno – os transneptunianos, a mais de 30 vezes a distância que a Terra está do Sol – terão conservado nos seus gelos a composição química original do disco de material de onde se formaram os planetas e os outros corpos do Sistema Solar.
Uma equipa internacional que inclui Nuno Peixinho, do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA) e da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC), publicou na revista científica Nature Astronomy, num artigo1 liderado por investigadores do Instituto Espacial da Florida, da Universidade da Florida Central, os resultados do primeiro estudo na luz infravermelha de um conjunto significativo de objetos transneptunianos.
Entre os 59 corpos gelados observados com o telescópio espacial James Webb, foi encontrado pela primeira vez gelo de dióxido de carbono (CO2 no estado sólido, designado “gelo seco”), e quase metade desses corpos têm também gelos de monóxido de carbono (CO).
Para lá de Neptuno existe um enorme disco de pequenos objetos gelados chamado Cintura de Kuiper. A esses objetos atribui-se o nome de transneptunianos. O planeta anão Plutão pertence a esta família. Alguns dos cometas que visitam os céus terrestres terão tido origem nesta região do Sistema Solar. Créditos: ESO/M. Kornmesser
“Não era esperada esta intensidade de dióxido de carbono. A conclusão imediata é a de que estes objetos se formaram mais perto do Sol do que estão hoje”, diz Nuno Peixinho, referindo-se ao conjunto de objetos gelados distantes onde terão tido origem alguns dos cometas que visitam os céus terrestres.
“É algo que já outros estudos sobre outras propriedades indicavam desde há alguns anos. Aparentemente, o gelo de CO2 nas fases de formação do Sistema Solar terá sido bem mais estável do que se supunha, para explicar que exista tanto nos dias de hoje”, acrescenta este especialista em pequenos objetos gelados do nosso sistema planetário.
“A astrobiologia irá também dar mais atenção ao papel desempenhado no passado pela queda de cometas na Terra, e ao enriquecimento em carbono, e se tal teve ou não um papel importante no surgimento de vida”
Nuno Peixinho
O investigador Nuno Peixinho, do IA e da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra.
Uma parte dos corpos agora observados com o James Webb apresenta pouco dióxido de carbono e nenhum monóxido de carbono (CO) na sua superfície. Um segundo grupo, onde foi encontrado monóxido de carbono, apresenta a maior quantidade de dióxido de carbono. “A descoberta de muito gelo de monóxido de carbono é a outra grande novidade”, diz Nuno Peixinho.
“Mesmo na Cintura de Kuiper, a região onde se encontram os objetos que estudamos, as baixas temperaturas são, ainda assim, suficientemente altas para converter o gelo de CO em gás. No entanto, naqueles objetos com muito dióxido de carbono encontramos também monóxido de carbono. Isso faz-nos supor que esse monóxido de carbono não está lá desde a formação destes objetos.
“Resulta provavelmente de lentos processos em que partículas muito energéticas, vindas de fora do Sistema Solar, acertam em moléculas de CO2 e conseguem tirar-lhes um átomo de oxigénio, convertendo-as em moléculas de CO.”
O dióxido de carbono é uma molécula comum no Sistema Solar, sendo o principal ingrediente das atmosferas de Vénus e Marte. Foi detetado em abundância nas caudas de cometas e em pequenos corpos gelados à mesma distância do Sol que os planetas gasosos, designados Centauros. Era previsível que o dióxido de carbono existisse também nos objetos que se encontram para lá da órbita de Neptuno.
Porém, a molécula de CO2 não tinha ainda sido aí detetada até agora, provavelmente devido à grande distância. Além disso, certas assinaturas que o dióxido de carbono inscreve na luz solar refletida pelos transneptunianos encontram-se na banda do infravermelho, que só é possível identificar com confiança com instrumentos no espaço, como os do telescópio espacial James Webb.
Esta investigação lança agora novos dados para futuras pesquisas. Modelos computacionais que simulam o modo como evolui a composição química e a temperatura dos pequenos corpos ricos em gelos do Sistema Solar exterior precisarão de ser ajustados e de ter em conta a quantidade apreciável de monóxido de carbono.
Conceção artística de um objeto gelado da Cintura de Kuiper, mais de 40 vezes mais longe do Sol do que a Terra. Créditos: NASA/Johns Hopkins University Applied Physics Laboratory/Southwest Research Institute/Alex Parker
“A astrobiologia irá também dar mais atenção ao papel desempenhado no passado pela queda de cometas na Terra, e ao enriquecimento em carbono, e se tal teve ou não um papel importante no surgimento de vida,” comenta Nuno Peixinho.
Este trabalho é o produto de um dos primeiros projetos que observaram com o telescópio espacial James Webb, “Discovering the Compositions of Trans-Neptunian Objects, Icy Embryos for Planet Formation (DiSCo-TNOs)”, a cuja equipa pertence Nuno Peixinho. As observações com o James Webb no infravermelho foram comparadas com as propriedades já conhecidas na observação de Centauros e transneptunianos na luz visível, área em que Nuno Peixinho trabalha há mais de 20 anos.
Com os 300 objetos já observados dessa forma foram identificadas pelo menos três famílias de transneptunianos quanto à sua natureza química. Este estudo das moléculas CO2 e CO com o James Webb permitiu identificar apenas duas. “Quando se supõe que estes objetos se formaram numa vastíssima região entre a atual órbita de Saturno e bem para lá de Neptuno, era de esperar uma maior diversidade”, comenta Nuno Peixinho.
“Os próximos passos passarão pela simulação computacional da evolução destes objetos e repensar novas experiências em laboratório sobre a formação e evolução de gelos em ambientes muito frios, no vácuo, e sob radiação.”
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