Primeiros resultados do satélite CHEOPS revelam estrela peculiar e exoplaneta extremo

WASP-189 b: Trânsito e Ocultação

Imagem artística de um trânsito e uma ocultação do exoplaneta WASP-189 b (Crédito: Consórcio da missão CHEOPS).

O exoplaneta WASP-189 b, detetado por uma equipa a que pertencem vários investigadores do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA), terá uma temperatura de quase 3200º C.

Lançado em dezembro do ano passado, o telescópio espacial CHEOPS, da Agência Espacial Europeia (ESA), detetou um dos mais extremos exoplanetas conhecidos até hoje. O WASP-189 b está 20 vezes mais próximo da sua estrela do que a Terra está do Sol, completando uma órbita nuns estonteantes 2,7 dias, sendo categorizado como um “júpiter” quente1. O resultado2, publicado hoje na revista Astronomy & Astrophysics, contou com a participação de vários investigadores do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA3).

Os investigadores do IA e da Universidade do Porto (UPorto), Susana Barros e Olivier Demangeon, coordenam dois dos seis programas científicos da missão: Caracterização Extraordinária de Planetas e Caracterização de Atmosferas dos Exoplanetas.

Graças à enorme precisão do CHEOPS, conseguimos medir a luz emitida pelo lado diurno deste exoplaneta. Isto deu-nos alguns dados acerca das condições da atmosfera deste planeta tão exótico. A sua temperatura de cerca de 3160º C torna-o tão quente como uma estrela de pequena massa
Olivier Demangeon

Além disso a estrela-mãe é uma estrela azul, sendo maior e quase dois mil graus mais quente do que o nosso Sol, e com uma peculiaridade: “A precisão inédita dos resultados revelou que a estrela roda tão depressa que é deformada, sendo alongada no equador e achatada nos polos. Isto leva a que os polos da estrela sejam mais quentes e brilhantes do que o equador”, esclarece Susana Barros.

Algumas comparações entre o sistema WASP-189 e o Sistema Solar (Crédito: Consórcio da missão CHEOPS)

O satélite CHEOPS (sigla inglesa para Characterising Exoplanet Satellite, ou satélite de caracterização de exoplanetas) foi desenhado para observar estrelas próximas, à volta das quais já se sabe existirem exoplanetas. Através de medição com extrema precisão das variações do brilho das estrelas-mãe, os dados do CHEOPS permitem que os investigadores possam fazer uma caracterização dos exoplanetas, e com isso, aumentar o nosso conhecimento sobre como estes se formam e evoluem ao longo do tempo.

Através da observação de trânsitos4 do WASP-189b em frente à sua estrela, os dados do CHEOPS permitiram ainda determinar que o planeta terá cerca de 1,6 vezes o diâmetro de Júpiter.  A diferença de brilho entre os polos e o equador permitiu ainda medir que a inclinação da órbita do planeta relativamente à rotação da estrela é bastante inclinada, o WASP-189 b a passar próximo dos polos da estrela.Isto sugere que o planeta se terá formado mais longe da estrela, tendo mais tarde sofrido distúrbios gravitacionais de outros planetas ou até uma estrela de passagem, que lhe inclinaram a órbita e o empurraram para muito perto da estrela, onde se encontra atualmente.

Curvas de luz de um trânsito e de uma ocultação do exoplaneta WASP-189 b, obtidas através dos dados do CHEOPS. (Crédito: Consórcio da missão CHEOPS)

Sérgio Sousa (IA & UPorto) e Nuno Cardoso Santos (IA & Dep. de Física e Astronomia da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto) são os representantes portugueses no conselho do consórcio do CHEOPS. Para Sousa: “O CHEOPS continua a observar e os resultados até agora recolhidos e analisados têm superado as nossas expetativas”.

Este é apenas o primeiro resultado publicado com dados da missão CHEOPS no estudo de atmosferas de exoplanetas, uma área na qual a equipa do IA e da FCUP está particularmente envolvida
Nuno Cardoso Santos

O consórcio do CHEOPS é liderado pela Suíça e pela ESA. Conta com a participação de 11 países europeus, sendo que em Portugal a participação científica é liderada pelo IA. A participação do IA no consórcio do CHEOPS faz parte de uma estratégia mais abrangente para promover a investigação em exoplanetas em Portugal, através da construção, desenvolvimento e definição científica de vários instrumentos e missões espaciais, como o CHEOPS ou o espectrógrafo ESPRESSO, já em funcionamento no Observatório do Paranal (ESO).

Esta estratégia irá continuar durante os próximos anos, com o lançamento do telescópio espacial PLATO (ESA), e a instalação do espectrógrafo HIRES no maior telescópio da próxima geração, o ELT (ESO).

Nos próximos anos espera-se também que o CHEOPS observe centenas de exoplanetas conhecidos, expandindo ainda mais o trabalho que começou com o WASP-189 b. Irá também detetar novos exoplanetas e até exoluas, assim como investigar a composição interna e as atmosferas de exoplanetas.


Notas

  1. Um “Júpiter Quente” é um tipo de exoplaneta com massa semelhante à de Júpiter, mas que orbita muito próximo da sua estrela, com períodos inferiores a 10 dias (por comparação, Mercúrio demora 88 dias a completar uma órbita em torno do Sol).
  2. O artigo “The hot dayside of WASP-189 b and its gravity-darkened host star seen by CHEOPS”, por M. Lendl et al. (incluindo S.C.C Barros, O.D.S Demangeon, N. C. Santos e S.G. Sousa), foi publicado na revista Astronomy & Astrophysics (DOI: 1051/0004-6361/202038677)
  3. O Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA) é a instituição de referência na área em Portugal, integrando investigadores da Universidade de Lisboa e da Universidade do Porto, e englobando a maioria da produção científica nacional na área. Foi avaliado como “Excelente” na última avaliação de unidades de investigação e desenvolvimento organizada pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT). A atividade do IA é financiada por fundos nacionais e internacionais, incluindo pela FCT/MCES (UIDB/04434/2020 e UIDP/04434/2020).
  4. O Método dos Trânsitos consiste na medição da diminuição da luz de uma estrela, provocada pela passagem de um exoplaneta à frente dessa estrela (algo semelhante a um micro-eclipse). Através de um trânsito é possível determinar apenas o raio do planeta. Este método é complicado de usar, porque exige que o(s) planeta(s) e a estrela estejam exatamente alinhados com a linha de visão do observador.


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