Artigo por Tiago Campante, publicado no seu blogue, com base no comunicado de imprensa do IA.
Uma equipa internacional, na qual me incluo, confirmou recentemente o primeiro candidato a exoplaneta detectado pelo telescópio espacial Kepler (NASA), cujo lançamento ocorreu há 10 anos.
Investigador do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço e da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, é especialista em física estelar e ciência exoplanetária, contando com mais de 100 publicações em revistas científicas da especialidade. Tem um papel ativo em várias missões da NASA (Kepler/K2 e TESS) e da Agência Espacial Europeia (PLATO e ARIEL).
A confirmação do exoplaneta KOI 4.01 (agora designado oficialmente de Kepler-1658 b) foi aceite para publicação na revista The Astronomical Journal (link para o artigo aqui).
A confirmação da natureza planetária de Kepler-1658 b, dez anos após o lançamento do satélite Kepler, é um exemplo de como não é de todo trivial a validação de novos exoplanetas, especialmente aqueles que são detectados pelo método dos trânsitos. O Kepler detectou milhares de candidatos a exoplanetas através deste método durante os quatro anos em que se manteve em operação.
Porém, uma vez que existem vários fenómenos astrofísicos capazes de imitar um trânsito planetário, todas as detecções são inicialmente classificadas como “candidatos”, sendo necessária uma análise posterior mais detalhada para excluir a possibilidade de se tratar de um falso positivo.
Apesar de ter sido a primeira detecção do telescópio espacial Kepler, o caminho para a confirmação de Kepler-1658 b foi atribulado. A estimativa inicial do tamanho do planeta estava errada, pois era baseada no tamanho da sua estrela mãe, cujo diâmetro estava subestimado.
Mais tarde, este sistema foi catalogado como falso positivo quando os efeitos detectados na estrela (i.e., um eclipse secundário pronunciado) não correspondiam ao que se esperava para um sistema com aquela configuração. Como digo frequentemente, esta é uma prova de que, para compreendermos melhor os planetas, temos primeiro de conhecer a sua estrela mãe em detalhe.
A natureza extrema deste sistema planetário irá permitir aos astrónomos perceber melhor os limites físicos da interacção que provoca a queda em espiral de um planeta em direcção à superfície da sua estrela.
Foi a análise das ondas sonoras retidas no interior da estrela, técnica designada de astrossismologia, que possibilitou reavaliar com precisão o tamanho da estrela. O facto de a estrela ser três vezes maior do que originalmente se pensava significa que o seu planeta é também três vezes maior. Podemos assim afirmar com elevado grau de confiança que o planeta Kepler-1658 b é um júpiter quente, orbitando a sua estrela a cada 3,8 dias.
A estrela Kepler-1658 é 50% mais massiva e três vezes maior do que o Sol, com o planeta Kepler-1658 b a orbitar a uma distância de apenas 0,05 unidades astronómicas (cerca de 8 vezes mais próximo do que Mercúrio está do Sol), o que o torna num dos planetas conhecidos mais próximos de uma estrela evoluída. Este tipo de planeta é raro, e o porquê do seu reduzido número é ainda pouco compreendido.
A natureza extrema deste sistema planetário irá permitir aos astrónomos perceber melhor os limites físicos da interacção que provoca a queda em espiral de um planeta em direcção à superfície da sua estrela. Os dados preliminares apontam para que este processo seja mais lento do que se pensava, e que por isso não será a principal causa da escassez deste tipo de planetas.