Sociedade

CHEOPS, uma odisseia (muito portuguesa) já está no Espaço

18 dezembro 2019 18:05

esa

O investigador português Nuno Santos, membro do conselho de coordenação da missão, falou com o Expresso a partir da Guiana Francesa, horas antes do lançamento do satélite

18 dezembro 2019 18:05

O frenesim era elevado, esta terça-feira, no centro espacial de Kourou. Ali, na Guiana Francesa, todos aguardavam pelas 5h45 (8h45 em Portugal), horário apontado para o lançamento do satélite CHEOPS, pronto a ser empurrado até ao Espaço por um foguetão russo Soyuz-Fregat. Mas uma falha no software que controla a contagem decrescente acabaria por abortar a operação. A expectativa ficava em terra, a mesma onde se encontrava naquele momento Nuno Santos, representante português no conselho coordenador da missão.

Eram 17h30, menos três na Guiana Francesa, quando o telefone de Nuno tocou. Contactado pelo Expresso, à mesma hora que a equipa russa estava reunida para decidir a data da nova tentativa de lançamento, o investigador do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA) adiantou: “A expectativa é que possa ser lançado amanhã. Só pode ser lançado quando o Sol está quase a nascer, porque o CHEOPS vai estar numa órbita polar, sempre entre o dia e a noite”.

Dito e feito. O satélite da ESA (Agência Espacial Europeia), equipado com tecnologia de três empresas lusas e com coordenação científica do IA, subiu nos céus durante a alvorada desta quarta-feira até uma altitude de 700 quilómetros, onde vai orbitar a Terra durante os próximos três anos e meio com o objetivo de estudar exoplanetas.

“O CHEOPS não vai procurar exoplanetas, vai estudar aqueles já conhecidos” e “tem como objetivo caracterizá-los”, frisa Nuno Santos ao Expresso. O investigador e também docente no Departamento de Física e Astronomia da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto explica o procedimento. “Aquilo que faz é usar um efeito geométrico para conseguir determinar o tamanho de um planeta”, que “quando passa à frente da sua estrela vai tapar um pouco do seu brilho”.

Mas quais são, então, os grandes trunfos desta pequena missão? O professor responde: “Medir esse trânsito com uma precisão que antes não era possível” e “apontar para onde nós quisermos no céu, enquanto as missões passadas apontaram para uma zona específica”. A caça do minissatélite europeu na vizinhança cósmica busca “particularmente estrelas brilhantes, porque ao termos mais luz consegue-se uma maior precisão”.

E a que mundos quer o satélite de 280 quilos tirar as medidas? “O foco está numa gama de planetas com diâmetros comprendidos entre a Terra e Neptuno”, refere o especialista de 46 anos. “Queremos aferir a densidade desses planetas para depois perceber qual é a sua composição química e tentar compreender melhor como se formaram”, prossegue Nuno Santos, garantindo que “os dados vão permitir também estudar a atmosfera”.

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O desenvolvimento do CHEOPS ficou entregue a um consórcio de 11 países. “A participação do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço na missão surgiu por convite para liderar a componente científica”.

Ao conhecimento do IA juntou-se a contribuição da empresa Deimos Engenharia, responsável por desenvolver o software que irá analisar os dados recolhidos. Este foi um trabalho em parceria que o investigador descreve como “exemplar entre academia e indústria”.

A cargo da FreziteHP ficou a produção das proteções que vão garantir que os equipamentos aguentam a amplitude térmica extrema do espaço. Também a portuguesa LusoSpace, que investiga novas tecnologias e a sua aplicação no espaço, participa no projeto.

“É fundamental para a ciência portuguesa estar no topo” e “a única maneira é entrando neste tipo de projetos”, afirma Nuno Santos. “O facto de termos tido uma voz ativa sobre qual era a ciência que queríamos fazer com este telescópio coloca-nos numa posição privilegiada”, conclui.