10 maio 2019 9:33
Há uma nova visão da astrofísica que considera que os corpos para lá de Neptuno como Plutão, resquícios da formação do Sistema Solar, são algo de intermédio entre um planeta e um cometa
10 maio 2019 9:33
Há uma atmosfera no nono planeta do Sistema Solar, Plutão, apesar de ser um planeta anão, com menos de um quinto da massa da Lua, o satélite natural da Terra. Mas é uma atmosfera ténue e de uma natureza sazonal, desaparecendo no inverno ao condensar-se na forma de geada, revelam os resultados de um estudo internacional que envolveu a participação de um astrofísico português, Pedro Machado.
O estudo, publicado na revista "Astronomy and Astrophysics", acompanhou a evolução da atmosfera de Plutão ao longo de 14 anos, entre 2002 e 2016, tendo analisado a sua composição entre os 5 km e os 380 km de altitude, período que corresponde ao verão no hemisfério norte deste planeta anão, onde predominam os reservatórios de gelo de azoto, que sublimam pela exposição à proximidade ao Sol.
Uma rotação completa de Plutão demora 6,39 dias terrestres e a sua órbita à volta do Sol é percorrida em 248 anos terrestres. Como o seu eixo de rotação é muito inclinado, move-se quase deitado na sua órbita, "o que faz com que exponha permanentemente ao Sol as latitudes mais a norte durante uma fração dos mais de dois séculos que demora a sua volta completa ao Sol", explica um comunicado do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA).
Planeta anão ou cometa?
"Cada vez mais olhamos para a atmosfera sazonal de Plutão como uma atividade cometária", constata Pedro Machado, investigador do IA e da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. "Como é um corpo de pequena massa", com uma gravidade reduzida, "as moléculas de azoto atingem a velocidade de escape com muita facilidade e Plutão perde atmosfera como os cometas". Com a chegada do inverno devido ao maior afastamento do Sol, as temperaturas da atmosfera estão a baixar e as moléculas de azoto "começam de novo a formar cristais perto da superfície do planeta, num processo semelhante à geada de água aqui na Terra", esclarece o investigador.
Sendo assim, Plutão é um planeta anão ou um cometa? "É algo de intermédio entre um cometa e um planeta, porque tem caraterísticas dos dois", afirma o cientista ao Expresso. "Esta nova visão é muito recente em relação aos chamados corpos transneptunianos como Plutão", que estão para lá de Neptuno. São planetas anões, asteróides e cometas, "resquícios da formação do Sistema Solar". E por isso podem dar muitas pistas sobre o que se passou nessa altura, há 4600 milhões de anos, e em especial como se formou a Terra.
"Quando Plutão está no periélio, isto é, mais perto do Sol, escapam-se mais moléculas do planeta, quase como se fosse a cauda de um cometa" ao aproximar-se da nossa estrela. "Mas a sua gravidade é suficiente para que, quando está mais longe do Sol (no afélio), as moléculas de azoto da sua ténue atmosfera cristalizem na forma de geada", conta Pedro Machado."E é isto que está agora a acontecer".
A equipa de Pedro Machado contribuiu para este estudo internacional com duas observações realizadas a partir do telescópio do Centro Ciência Viva de Constância, no distrito de Santarém, e também com a sua experiência no processamento e análise de dados. É um telescópio com um espelho de apenas 40 cm de diâmetro, mas nestas observações "não interessa tanto a resolução espacial mas o tempo e a precisão do alinhamento", adianta o investigador do IA.
"Chegamos até a usar telescópios portáteis de 25 cm, munidos de uma câmara de vídeo rápida muito sensível, com muitos frames por segundo". Mas se o objetivo for o estudo da composição das várias camadas da atmosfera de Plutão, são necessários telescópios muito mais potentes, "com espelhos de um metro de diâmetro ou mais".